Tão logo soube da realização de um “IPA Day” local, a minha primeira ideia foi criar uma IPA só com lúpulos alemães e assim eu fiz. Resultado: não ficou boa. IPA tem que ser feita com lúpulos ingleses ou americanos, é que o confere a ela o “espírito” do estilo. Porém mesmo com este fracasso, não desisti e tentei fazer algo novo para mim, fiz uma “Black IPA” ou “Cascadian Dark Ale”, como alguns nomeiam o estilo.
Foi aí que me deparei com um problema. A “Black IPA” tem que ser escura como o nome indica, mas não pode ter adstringência ou mesmo excesso de sabores torrados, café, chocolate etc. Mas como fazer isto se para escurecer necessariamente se tem que usar maltes mais torrados? Sugestão de alguns especialistas: “steeping” ou em bom português infusão.
Confesso que no começo, com meu inglês fraquinho, eu traduzi o treco como passo ou etapa (“step”) e isto rendeu muita discussão e cabeça quebrada com um bom colega cervejeiro que se viu induzido por meu erro. Contudo, esclarecido o engano, caí em cima da literatura disponível e descobri algumas coisas interessantes acerca do tema.
Vamos lá.
Primeiro, a infusão pode ser feita quente ou fria e geralmente ajuda cervejeiros de extrato de malte a conferir a suas cervejas um toque extra. O que se faz é mesmo uma espécie de chá de malte para acrescentar ao mosto após a fervura e dar cor e sabor conforme o plano da receita.
Ocorre que, no meu caso, o problema era mais de acrescentar cor, daí a tal infusão me serviria apenas na parte que cuida dos maltes escuros. Então, vamos esquecer a infusão de maltes caramelados, porque admito que a maioria de nós faz brassagens com grãos e não precisamos incrementar nossas cervejas como sabores já incluídos no “grist”, e por isto também vamos esquecer a infusão quente.
Como se sabe, os maltes escuros quase não têm capacidade de conversão de açúcar. Ao serem aquecidos no processo de fabricação perdem esta característica. O seu papel é predominantemente conferir cor e sabor, sendo um de seus traços a tal adstringência decorrente do processo de cozimento que eu precisava evitar na minha “Black IPA”. Por isto, a infusão fria. Se eu não aqueço o meu “chá de malte”, eu não extraio adstringência, mantendo a extração de cor!
No entanto, quais os parâmetros para a tal infusão fria. Simples. Cinco vezes mais água em temperatura ambiente para o peso de malte que a ser usado. Misture o malte moído à água aos poucos, mexendo sempre e cuidando para que não fiquem grumos. No mínimo seis horas de infusão para que o processo ocorra. Parte dos artigos que li, recomendava uma lavagem com água a 74o, o que achei desnecessário.
Feito o processo, você terá um chá escuro que poderá ser acrescentado nos 10min finais da fervura para agregar a cor certa a sua “Black IPA” ou a outra cerveja em que, ao contrário das “Porters”, por exemplo, não precisem de adstringência, chocolate, café ou outros sabores decorrentes da brassagem de grãos escuros.
Duas últimas dicas são apenas considerar que o processo agrega menos cor escura que a mostura direta, de maneira que recomendo de 10% a 20% a mais de grãos escuros (no seu “software” de produção considere a inclusão do malte escuro como se fosse brassá-lo e apenas compense com este percentual quando for fazer a infusão). De outro lado, um dos artigos que consultei fala em compensar também na mostura principal com cerca de 10% a mais dos outros grãos, embora a pouca contribuição dos escuros para a obtenção de açúcares não afete tanto a eficácia geral do processo e, por isto, eu ache desnecessária esta medida.
Bibliografia:
Steeping Grains – http://www.jovialmonk.com.au/brewManual/Steeping_grains.pdf
Cold Steep – http://www.homebrewtalk.com/f36/cold-steep-roast-grains-507761/
Birth of a New Style: Cascadian Dark Ale – https://byo.com/videos/item/2013-birth-of-a-new-style-cascadian-dark-ale
Steeping versus Mashing – http://beersmith.com/blog/2011/11/17/brewing-beer-with-dark-grains-steeping-versus-mashing/
5 Comments
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Parabéns pelo post Hilmar. Estava pensando em fazer uma Black IPA e nem imaginava como resolver esse “problema”.
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Valeu Hilmar! muito bom, mesmo…
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Hilmar, você faz uma filtragem do “chá” antes de adicioná-lo à fervura?
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Tenho a mesma pergunta Sergio. Eu acho que sim, senão teríamos um trub relativamente grande na panela após o whirpool. Eu vou penerar antes de jogar. Vou fAzerbaijão no domingao.
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Muito bom! Parabéns…